Ressignificar traumas é uma decisão

 Ressignificar traumas é uma decisão

Os gritos eram ensurdecedores, a mãe pedia socorro e os filhos pequenos que tentavam  dormir, despertaram sobressaltados em meio aquela cena brutal de violência, nada podiam fazer. Apenas assistir a cena bárbara de um pai que espancava a própria esposa depois de chegar alcoolizado de um bar.

No dia seguinte, após uma noite traumática as crianças, Maria, de 6 anos e Pedro, de 8, vão para escola mas suas cabecinha as não conseguem esquecer a cena da noite anterior. Enquanto as outras crianças brincam, conversam E fazer as atividades propostas pela professora, Os pequenos irmãos parecem perdidos no tempo com olhar vazio e distante. Que opções teriam essas duas crianças vivendo em meio a esse ambiente em que as cenas de violência e abandono se repetem com tanta frequência?

Parece que a vida dos dois está sendo moldada a cada dia que passa, de uma forma negativa e desesperadora, roubando-lhes  os sonhos, a inocência e o futuro deles. Infelizmente a história não tem um final feliz, a mãe das crianças morre aos 45 anos vítima de câncer de mama, O pai após sofrer anos com cirrose hepática morre aos 50 anos de idade, Maria casa-se com Antonio, homem truculento e alcoólatra e Pedro não consegue fixar relacionamento, E atualmente está no quarto casamento, desempregado e alcoólatra.

A história é fictícia, quisera eu, pois apesar de a ter criado, tenho a triste certeza de estar narrando a história de milhares de Pedros e Marias ao redor do mundo. Crianças que crescem traumatizada pela violência doméstica e que acabam repetindo os mesmos padrões gerando novas famílias que da mesma forma serão completamente desestruturadas.

Como já abordei em outros textos meus, a formação da mente de uma criança é algo muito delicado e ao mesmo tempo complexo. As experiências sofridas por elas sejam boas ou más tendem a formar uma estrutura neural bastante sólida. Essas experiências podem perpetuar de forma inconsciente ao longo de toda a vida. Pedro e Maria de alguma forma reproduziram a história dos pais e possivelmente essas histórias ganharam espaço nas próximas gerações. A psicologia moderna explica a formação desses padrões bem como a Neurociência, os religiosos costumam chamar isso de maldição hereditária, na sua essência a raiz maléfica é a mesma gerando consequências catastróficas. Particularmente falando como autor do artigo, considero as duas formas de entender o fato e se considerarmos as visões científicas e espiritual da coisa, existe sim solução, uma forma de cura que quebra toda essa cadeia de efeitos maléficos.

Nas nossas mais profundas estruturas cerebrais emocionais temos um armazenamento de fatos e acontecimentos que são atemporais, ou seja não importa quanto tempo eles aconteceram, o fato é que estarão prejudicando cotidianamente a pessoa. A boa notícia é que esses traumas ocasionados na infância ou mesmo tem algum momento da vida adulta podem ser Ressignificados por intermédio de processos terapêuticos onde obviamente a fé de cada um torna-se um agente indispensável como parte do processo. Toda experiência carrega consigo um significado e gera uma estrutura complexa que pode ser organizada.

O primeiro passo é identificar que existe um padrão traumático, pois sim, o cérebro possui a capacidade de esconder de nós mesmos, como mecanismo de auto defesa, as nossas piores experiências.

O segundo passo é que você não é o que te aconteceu no teu passado, mas você é um novo a cada dia baseado em suas escolhas e decisões, portanto uma vez identificado trauma padrão o bloqueio, é preciso uma forte decisão de não viver debaixo de suas consequências, não somente por você, mas pela suas próximas gerações, seus filhos e netos. E aí que entra a complexa jornada do ressignificar, que deve ser conduzido por um profissional de alta capacitação e de alta empatia, para entender a mente da pessoa que sofre.

O terceiro passo é a perseverança, que ao contrário do que muitos pensam, não significa apenas ficar de pé aguardando que tudo passe, mas lutar em meio a quedas vitórias e busca por novas estratégias.  A pessoa que sofre com algum trauma tem toda a possibilidade de libertação daquilo que passa, dependendo  apenas da sua decisão e do seu proceder. Vivemos uma era que a meu ver e também na visão de muitos outros cientistas, temos a possibilidade de entender como uma só coisa, o espiritual e o científico, e muitas soluções estão à sua disposição.

Quero encerrar esse artigo com uma citação bíblica que pra mim fez e faz toda a diferença na minha história de vida, marcada pelas batalhas, como a de qualquer outro ser humano que conheço.

“Porque sou eu que conheço os planos que tenho para vocês’, diz o Senhor, ‘planos de fazê-los prosperar e não de causar dano, planos de dar a vocês esperança e um futuro.”

Um abraço fraterno

João Paulo Gurgel

Biólogo, terapeuta esp. Em Neuropsicologia.