Conto de Fadas

 Conto de Fadas

O psiquiatra suíço Carl Jung costumava dizer que assim como os mitos, as lendas e as fabulas, os contos falam a linguagem da alma e são similares aos nossos sonhos e fantasias.

Lembram de quando éramos criança e nos encantávamos com as princesas, fadas, rainhas e bruxas, revivendo-as em nossas fantasias e brincadeiras?

Pois bem, quando ‘adultecemos’ perdemos esse contato lúdico com os contos, dando primazia a consciência, e parte desse mundo arquetípico vai para o inconsciente.

Mas, se reconectamos com os nossos contos favoritos da infância, podemos alimentar a alma e resgatar impulsos e respostas para nossos sonhos esquecidos.

Lembro-me bem dos meus contos favoritos, alias, eu, minha mãe e minha madrinha.

Eu as fazia assistir todos os dias santos e todos santos dias, ‘A Pequena Sereia’ e ‘Em Busca do Vale Encantado’.

O primeiro fala sobre um sereia (Ariel) que sacrifica seus bens mais preciosos; a sua voz e sua família, para se transformar em humana e viver um grande amor.

O último diz sobre um dinossauro (Littlefoot) que devido a um terremoto e a morte de sua mãe por um tiranossauro Rex, se vê sozinho no mundo e parte em busca do vale encantado e dos seus avós.

Ambos passam por diversas provações e tarefas antes de chegarem ao destino almejado.

Ao traçar um paralelo desses dois contos como a minha própria vida, vejo que assim como Littlefoot, eu só aprofundei em mim, quando de fato cortei o cordão umbilical invisível que me prendia a minha mãe.

Caçula de três mulheres, eu mantenho uma relação muito especial com a minha mãe, que sendo metade Hera e metade Demeter, me nutriu e me fortificou, mas ao mesmo tempo manteve uma grande influência nas tomadas das minhas decisões, inclusive a de vir morar em Londres.

Apenas quando decidi interromper as ligações telefônicas diárias, a escutar, mas não seguir aquela velha opinião formada sobre tudo de mãe, que o mergulho mais profundo se deu. Foi aí que a minha tarefa começou. Meu processo de individuação se deu início.

Como Littlefoot, eu iria enfrentar o mundo sozinha, entre erros e acertos, mas do meu jeito, buscando o meu caminho.

Ao contrário de Littlefoot (e graças a meu bom Deus) não tivemos que sofrer uma perda maior para nos encontrarmos e sim ganhamos uma relação muito mais leve, sem tantas cobranças.

Hoje, enxergo minha mãe enquanto ser humano, com falhas e imperfeições, e ela, apesar da corujice, me reconhece como eu me conheço: Um ser individuo, que com coragem tenta abraçar o mundo a sua forma, mas sempre acolhida e protegida pelo manto das suas preces e pelo seu amor infindável.

Já aos meus sete anos de idade, eu passava horas no mar ou na piscina na tentativa de criar barbatanas e adentrar no oceano profundo da minha alma, ou apenas fugir, ou ainda me tornar duas coisas ao mesmo tempo: metade peixe, metade mulher. Só que enquanto Ariel desejava subir a superfície, eu queria descer ao fundo do mar.

Aquela sapiência intrínseca e inata que sabe antes da gente saber, já me dizia que o meu movimento seria o da descida antes da ascensão. Mais uma conotação do mergulho profundo em mim: fui buscar as respostas na imensidão vasta e azul da minha alma.

A primeira vez que fiz a leitura desse conto, foi a de que Ariel é uma mulher-peixe que sacrifica o seu lar, a sua família e a sua voz, para se modificar fisicamente (ela cria pernas) a fim de viver um amor romântico. 

Ora, se ela pode se modificar, também poderia ele, mas sabemos que na maioria das vezes a renúncia é maior parte da mulher. E sob a minha ótica, a transformação foi feita por ela, a partir dela e PARA ela.

Em uma releitura que ressoa bastante com meu coração, é a de que o amor transforma e que qualquer renúncia é pouca para se viver o amor, porque quando se vive o amor, não há renúncia, apenas ganho (e não é apenas o amor romântico que me refiro)!

Ariel, teve coragem de deixar o conhecido para se inserir no novo mundo. Ela ‘sacrificou’ tudo que tinha de mais precioso para subir à superfície.

Trocou barbatanas por pernas, revestiu suas escamas com pele, reaprendeu a andar, aprendeu a respirar o ar leve da superfície, mas não sem antes passar por muitas provações.

Metade humana, metade peixe, sentia que não se encaixava em lugar algum, mas resolveu se buscar. Largou tudo pra trás sem pestanejar e foi o novo mundo desbravar.

Eu não tinha um príncipe a me esperar do outro lado, o que eu tinha, era um espelho, aguardando para ser encarado. Pois bem, assim como Ariel, fui capaz de deixar minha zona de conforto para explorar os territórios até então desconhecidos da alma.

Desci em mim, me perdi, vivi e ainda vivo uma grande dualidade, por vezes sem saber exatamente aonde me encaixo. Me transformei, continuo a me transformar, aprendi a andar no meu ritmo que apesar de exagerado, é meu e voltei a superfície mais leve para viver o conto de Fabi.

E você? Tem algum conto seu?

 

Por: Fabiana Dórea

Advogada e Life Coach pela Animas Centre for Coach
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TEL.: (+44) 7740 102642